terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

SONETILHO EM DÓ


   
SONETILHO EM DÓ


Desde que vi minha face
que já pouco me contempla;
desde que sorvi a gota
do rio que se fez lágrima;

desde que o mundo olvidara
sua primeira maçã;
desde que os punhos do homem
se ampliaram para a guerra;

desde que minhas sandálias
em pó fizeram caminhos
sem que ao menos fosse dia;

desde que plantei cigarras
em vez de frutas e couves,
degusto ausências plenárias.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

SONETO ÀS BORBOLETAS



SONETO ÀS BORBOLETAS

Sempre dou baixa aos dias na folhinha.
Porém, quanto mais risco, mais florescem,
quer nos blocos seguintes, quer na minha
janela aberta aos outros que amanhecem.

Não sei das vezes que a esse gesto eu vinha
dando o meu tempo que as aranhas tecem;
tantos dias iguais, seja à tardinha,
seja às estrelas quando resplandecem.

Montões de calendários tomam conta
de algumas prateleiras que derramam
velhos papéis inúteis, dessa monta.

Números, datas, portas e janelas,
foram, decerto, árvores que inflamam
para os céus borboletas amarelas.

domingo, 24 de fevereiro de 2013

O VINHO DO MÍSTICO


O VINHO DO MÍSTICO

  Ao Yogue Paramahansa Yogananda


Testemunhas de mim são as garrafas.
Louvo, ao secá-las, ao meu bom Khayyam.
Ao néctar místico lançam-se tarrafas,
e a pesca é boa quando a vida é sã.

Embriago-me de Deus toda manhã,
verticalizo a dor como as girafas.
Alcanço a plenitude. Adoro Pã,
danço longe do tédio e das estafas.

Meu turbante rebrilha. Posto em lótus,
ultrapasso o Nirvana e tiro fotos
da solidão mais cósmica do além.

Bebo com Deus a chuva que ele ama.
É sempre bom beber. O vinho é chama
que se transmuda como lhe convém.



sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

SONETO AOS IDOS

(foto de r. samuel)




SONETO AOS IDOS

Um rascunho de nuvens me sugere
campos lavrados por um cinza antigo;
e algo de mim nas franjas desse trigo
aos amenos de um bosque me transfere.

Nada em tanto vazio assusta ou fere,
oblíquas horas rangem nesse abrigo
onde o tempo é cifrado e a voz do amigo
clama sem a voz do outro, ainda que espere.

Dali fui para o monte e vi cavalos,
a força do trabalho que, a intervalos,
dava às covas ossadas ambulantes.

Destroçou-me esse impacto, esse contraste
entre pobres e ricos; não me baste
que este mundo não seja o que era antes.


quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE PENSA



CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE PENSA

Era uma vez Drummond no banco duro
do bonde antes da náusea, apenas flor:
lia o jornal sem letras lendo o muro
nos tantos feitos para o desamor.

Mas, quem era Drummond nesse futuro
onde o passado argila-se na cor
do riso que de súbito misturo
ao Drummond proletário, agro de amor?

O Drummond que se inclina nesta foto
lembra um nenúfar, contemplando, ignoto,
o além dos móveis, lajes, artefatos.

É uma cegonha em busca de sua imagem
refletida na pedra, essa paisagem
de Itabira, um suspiro entre retratos.



segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

ZARATUSTRA


ZARATUSTRA
  
   Ao gênio de Nietzsche


Tudo é claro na voz de Zaratustra,
eco profundo, solitária voz.
Zaratustra é a certeza do que fustra,
Zaratustra é o cristal de todos nós.

Zaratustra é a montanha. E nada custa
romper com a treva em busca dessa foz,
olhar duplo que os âmagos perlustra,
águia e serpente num conúbio atroz.

Ver alguém que padece e fazer nada,
ter piedade ao invés de audácia plena,
unir-se á covardia, à mão armada?

Isto é ser homem, cíclope de barro,
oxidado animal de alma pequena,
do super-homem vergonhoso escarro.

sábado, 16 de fevereiro de 2013

O CRISTO DE SARAMAGO


O CRISTO DE SARAMAGO

A rede, sim, transluz-se e colhe o peixe.
A terra é sangue, inútil proteção
ao cordeiro aflitivo – que se o deixe
manumisso da horrível sagração.

A tempestade, o mar, o rubro feixe
se azula em mim nos touros de um clarão...
Ventos, parai! Que o mundo não se queixe
dessa fúria de Deus em minha mão.

Que são curas, milagres como o vinho,
meus pássaros de areia, o gesto santo
no adiar-se a vida para mais caminho?

Uma simples mulher curou-me, um dia,
das chagas com suas lágrimas; e o quanto
dera-me alívio à cruz donde eu pendia.


quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

SONETO A UMA AGENDA




SONETO A UMA AGENDA

Para quem chega ou sai, vide na agenda
telefone, endereço, e assim, talvez,
o número da campa onde o freguês
terá deixado a última legenda.

Todo um passado nela se desvenda
com a rolagem dos anos. No entremês
de novas baixas, outros, por sua vez
plantam seus nomes e refaz-se a lenda.

Nomes famosos como Pedro Nava,
poetas humildes como Jota Cê,
já se foram da letra que os guardava.

Antigas pautas mostram-nos, porém,
que entre os vivos há mortos; estes que
nunca respondem, nada, pra ninguém.

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Célebre poema de Jorge Tufic,


Célebre poema de Jorge Tufic,
da vanguarda da poesia amazonense:

Ode
Campo
Bode

(http://pt.wikipedia.org/wiki/Clube_da_Madrugada)

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

POETA JORGE TUFIC RECEBE PREMIO RAUL BOPP DA UBE-RJ E O DEDICA AO ACRE

POETA JORGE TUFIC RECEBE PREMIO RAUL BOPP DA UBE-RJ E O DEDICA AO ACRE







A solenidade está sendo realizada agora,26.10.2012, 15h,na Academia Brasileira de Letras.

A União Brasileira de Escritores do Rio de Janeiro classificou o livro QUANDO AS NOITES VOAVAM como o melhor livro de poesia publicado no país em 2011. De fato, Jorge Tufic é um dos grandes escritores brasileiros, autor de uma obra rara, dotada de linguagem lírica e de alta metáfora, sonora e imagística, flutuante e bem elaborada. Jorge Tufic tomou posse na Cadeira 18 da Academia Acreana de Letras,em 2005,em solenidade própria,inédita,aberta ao público e no plenário da Assembleia Legislativa do Acre,com seus parlamentares oficialmente convidados e presentes.



Vitrais das noites e lendas visitam Brasília



    Meu verso é semente


    lançada entre ruínas


    e olhares de fábula.


   (Jorge Tufic)

Quando as noites voavam’ fazem chegar ao ápice o sentimento de ser acreano, brasileiro e pan-amazônico, da fraternidade universal, de Jorge Tufic , obra de sabores e saberes da vida.Prova-o o tempero da magnanimidade de seu gesto ao dedicar o prêmio ao Acre,sua terra natal.A "voz do poeta Jorge Tufic",lá,parodiando , já reverberara " nos vitrais das noites e lendas que cobriram de magia e encantamento o Auditório do Museu Nacional".Testemunha,Adrino Aragão, ao escrever o que viu.Diante de um público seleto, estudantes, jornalistas, professores, escritores, críticos, leitores, gente que ama a Poesia e as Artes de modo geral". Aqui,confrade Jorge Tufic,Academia Acreana de Letras,sua gente e raízes,no vão,filhotes de Cobra Grande voando em companhia de Boléka,a Onça Invisível do Universo.Sem a puçanga de Curupira para levar à UBE e ABL,no Rio, nossos cabelos,unhas,sangue.Nem etc."Na mesma atmosfera que permeia as estórias dos mais antigos habitantes da Hiléia.

De fato, “Quando as noites voavam, de Jorge Tufic, é livro para ficar, ao lado de Cobra Norato, de Raul Bopp, como obra-prima da literatura brasileira. E, naturalmente, para ser lido e refletido, agora. Antes que os rios morram de sede, os pássaros silenciem, a floresta tombe em definitivo. E o homem, sem Deus, sem esperança no coração, desapareça da face da terra – como um verme engolido pela serpente insaciável da ganância e do egoísmo em acumular riquezas."

Os comedores de roça sempre estão chegando.

Aqui,de noite tem gente que voa,sem moquém.Cuidado.Todo dia tem música em terra sem rabo, Diuruna voa para os cumes da cidade.

Clodomir Monteiro
Presidente da Academia Acreana de Letras

domingo, 3 de fevereiro de 2013

RETRATO DE MÃE

Nossa infância era toda iluminada
    pelas fontes da tua juventude.
Armadura que tínhamos freqüente
para afastar as sombras e o perigo.
Eram fartos os dias com teus peixes
mergulhados no arroz: postas de ouro
não largavam seus brilhos nem suas luas.
Na escassez, entretanto, te inquietavas.
Ainda te vejo, o porte esbelto indo
por aqueles baldios transparentes
onde a luz, de tão verde, pincelando
os ermos, quanta música expandia!
Voltavas quase noite ao doce abrigo,
e o mundo inteiro, mãe, vinha contigo.
 
O texto é escrito com o intuito, com a busca de recuperar a imagem daquela criatura divina, dama antiga, fada e santa, busca infinita de volta ao útero materno, ao ninho antigo, àquele aconchego materno, onde tudo estava em paz, onde nela nos alimentávamos, nos encontrávamos com nossa originária semente, e para isso, para esse canto, o poeta pede a voz do pássaro, o pedal das nuvens, procurou, como Narciso, na água dos regatos, a imagem aquela que em nós dela nunca se esquece.
Mas nada.
Somente nos versos há a sua fotografia.
Mas...